krajcberg por krajcberg
“Enquanto a arte atual remete ao mundo mecânico de uma civilização do progresso material, e que as suas pesquisas estão atadas à máquina, eis que eu me dirijo, a um passo sempre mais firme, em direção à natureza, cujos mistérios inumeráveis não cessam de me atrair com mais força.
A natureza… minha vida sempre esteve metida nela. Levando a me evadir dos homens, mergulhei fisicamente nessa eterna fonte de criatividade e, sem dúvida alguma, ela determinou minha orientação, já antiga, ancorada, lá no fundo de mim mesmo. Pois as formas observadas na floresta tropical brasileira, onde vivi por muito tempo, a sua exuberância extraordinária em que eu, paradoxalmente, me debatia, exerceram sobre mim sua misteriosa fascinação.
E pouco a pouco, arrastado pela riqueza orgânica das formas naturais circundantes, virei as costas ao nosso mundo mecanizado e minha pesquisa alimentou-se das formas inéditas encontradas… Mas um desejo de expansão, a necessidade de uma verdadeira explosão para além dos limites habituais, a procura de uma terceira dimensão da obra conduziram-me a utilizar a sombra projetada e eu assim realizei obras que não são quadros nem esculturas: são obras totais, tentando aprisionar o espaço… A ambiência dinâmica que reveste é reforçada por sua textura cromática obtida com terras coloridas de Minas Gerais. A utilização de pedras e de terras coloridas naturais é, de resto, antiga em meus quadros, assim como as impressões de formas naturais sobre papel. Uma vez que a imaginação humana é infinitamente mais pobre do que a pródiga criatividade da natureza.”
“O homem realiza sua verdadeira personalidade procurando unir-se, o mais possível, à natureza.”
Teilhard De Chardin
Catálogo: multipla galeria
Exposição: Esculturas e Impressões Krajcberg
Setembro 1972
biografia
Frans Krajcberg, artista plástico, escultor, gravurista e fotógrafo, nasceu no ano de 1921 em Kozienice, Polônia, e naturalizou-se brasileiro em 1954. Sua mãe foi simpatizante ativa dos comunistas e Frans viu toda sua família ser dizimada pelos nazistas nos campos de concentração na época da 2ª Guerra Mundial. Em resposta, alistou-se no Exército Soviético como engenheiro construtor de pontes. Depois do conflito, viveu na Alemanha, onde estudou entre 1945 e 1947 na Academia de Belas Artes de Stuttgart e foi aluno do célebre Willy Baumeister. Emigrou em 1948 para o Brasil,
fixando-se inicialmente em São Paulo onde participou na montagem da 1ª Bienal, em 1951. Nos primeiros anos da permanência no Brasil, praticou uma pintura influenciada pelo Cubismo e pelo Expressionismo, em um desenho sintético de paleta baixa na qual predominavam tons de cinza e terra. Permaneceu em São Paulo até 1952, ano em que faria sua primeira exposição individual no Museu de Arte Moderna. No interior do Paraná, onde viveu até 1956, Krajcberg afastou-se do circuito das artes. Neste mergulho no hinterland paranaense, o contato com a natureza amadureceu seu olhar e lhe ofereceu novos instrumentos de trabalho.
Em 1957, conquistou o prêmio de Melhor Pintor Nacional na 4ª Bienal de São Paulo e transferiu-se para o Rio de Janeiro. Nesse momento, alternou sua vida entre Paris e Ibiza, com constantes retornos para reciclagem ao Brasil.
A estrutura bidimensional da pintura, entretanto, limitava seus horizontes e, a partir de uma primeira experiência em 1962, com as terras naturais de Ibiza, o artista sentiu uma necessidade crescente de mudança. Abandonou então a dimensão do plano pictórico, substituindo-o pelo tridimensionalismo do relevo ou da escultura. Aos poucos, Krajcberg foi reformulando a própria ideia de representação ou de interpretação da Natureza por meio da sua apropriação. Em um trabalho incessante de pesquisa sobre forma e matéria, utiliza elementos da natureza e os mais diferentes materiais de origem mineral, para criar relevos, esculturas e instalações com troncos de árvores, raízes aéreas do mangue e reproduzindo em papel japonês as marcas deixadas pelo mar nas areias de Nova Viçosa. Em 1964, após ter conquistado o prêmio Cidade de Veneza na 32ª Bienal de Veneza, Krajcberg visitou Itabirito e este encontro marcou sua maturidade enquanto artista.
Desde 1973, ele mantém um ateliê permanente em Nova Viçosa, no litoral sul da Bahia. Suas esculturas podem ser vistas nos mais importantes museus do mundo, como na França, Japão, Holanda e Espanha. Em Montparnasse, Paris, seus trabalhos estão expostos em uma galeria que tem seu nome na porta. Recentemente, realizou três grandes exposições na França, outras no Brasil, tendo recusado uma proposta de expor de maneira permanente suas obras no Guggenheim Museum de Nova York por não atenderem seu pedido de privilegiar a luta pela preservação da Amazônia.
O artista foi homenageado pelo prefeito de Paris Bertrand Delanoë em setembro de 2012, com a “Médaille de Vermeil de La Ville de Paris”, tornando-se Cidadão Honorário de Paris. A cerimônia aconteceu no Hotel de Ville, e foi prestigiada pelos membros e admiradores da “Association des Amis de Frans Krajcberg”, cujo presidente é o artista Claude Mollard. Em 2016, aos 95 anos, Krajcberg foi o principal homenageado da 32ª Bienal de São Paulo - Incerteza Viva.
No dia 15 de novembro de 2017, Frans Krajcberg faleceu. Suas cinzas foram depositadas em uma árvore do seu sítio em Nova Viçosa e todo o seu patrimônio, inclusive suas obras, foram doadas ao governo do Estado da Bahia.
“Se Mondrian passou da árvore ao quadrado, ele apenas soube aproveitar uma das infinitas possibilidades da árvore. E então, vamos rebentar o quadrado para reencontrar a árvore.”